Enviem -nos o Barrete !!!
Ainda vêm pessoas
de todo o lado para enfiar o Barrete na Cabana.
Fernando Andrade
descende e é o digno representante de uma linhagem excepcional de humoristas.
Será muito provavelmente impossível encontrar alguém que não se recorde dos
gloriosos tempos dos Parodiantes de Lisboa. Foram mais de 60 anos a fazer rir o
país e a popularizar Barretes, o doce que levou o nome de Salvaterra de Magos
aos quatro cantos de Portugal. Os Parodiantes de lisboa acabaram em 1997 mas a
Cabana dos Parodiantes perdura e está pujante, misturando memórias e muita
história com conceitos de hotelaria moderna.
Conte-nos um pouco da história dos Barretes.
Os Barretes foram popularizados pelos Parodiantes de
Lisboa, quando começaram a emitir há cerca de 68 anos. Eram bolos feitos pelo
meu avô, que entretanto começaram a ser publicitados através da rádio nos
finais dos anos 40, aquando do início das emissões dos Parodiantes. Nos anos 50
este bolo atingiu um patamar assinalável de fama e nos anos 60 foi o auge, com
excursões a virem de todo o lado para levar o bolo.
Um reconhecimento que se mantém até aos dias de hoje.
De tal forma que ainda hoje vêm pessoas de todo o lado e que fazem questão
de vir aqui "enfiar o Barrete".
A história do Barrete acaba por estar intimamente ligada à história dos
Parodiantes.
Os Parodiantes de Lisboa tinham um grupo de teatro nos anos 40, representavam
umas comédias escritas por eles próprios e começaram a dar nas vistas. Foram
convidados para contar umas anedotas na Rádio Peninsular e o sucesso foi tal
que passaram a ter um programa só deles. Surgiu o grupo "A Bomba",
que durou dois anos, até dar origem, em 1946, aos Parodiantes de Lisboa.
Lembro-me dos Parodiantes de Lisboa no ar entre as 13 e as 14 horas já no
final dos anos 70 ou mesmo no início dos anos 80.
Era o horário nobre, em que toda a gente almoçava, estava em casa ou no café
com o rádio de pilhas e fazia questão de não perder o programa dos Parodiantes.
Eles criaram um estilo muito próprio. Até a própria publicidade era uma
autêntica obra de arte humorística e a audiência que eles tinham não era de
estranhar porque as pessoas tinham prazer em ouvir o programa deles e os
próprios anúncios. Foi o programa mais ouvido de sempre da rádio, até acabar em
1997.
Pode resumir a árvore genealógica dos Parodiantes?
A família era muito grande, eram sete irmãos, que passaram a seis depois de
um ter falecido. Os mais velhos foram para Lisboa e fundaram os Parodiantes. o
meu pai era o mais novo dos irmãos e optou por ficar perto do seu pai, o meu
avô, e tomou conta deste negócio quando o meu avô faleceu. Portanto, a Cabana
dos Parodiantes é uma empresa familiar e está interligada com os próprios
Parodiantes e com a família.
Concorda com a ideia que os Parodiantes foram os percursores de uma forma
específica de humor que deu origem a outras ideias geniais como o Contra
Informação, por exemplo?
Exacto, concordo. De todos os projectos humorísticos que se têm formado nos
últimos anos o que mais se aproxima do modelo dos Parodiantes é o Contra
Informação. Repare que naquele tempo era necessário ter uma ginástica e uma
subtileza para criticar o Salazar muito superior aos dias de hoje, nos quais se
pode criticar com muita liberdade sem correr o risco de ir preso.
Há muita diferença no impacto da Cabana dos Parodiantes desse tempo e dos
dias actuais?
Nessa altura o impacto era muito grande porque a publicidade era diária e
estava muito fresca na cabeça das pessoas, que cá vinham em massa. Hoje ainda
temos pessoas que vêm à Cabana pela memória que têm do lugar, também há pessoas
que cá vêm regularmente e há os que perguntam se os Parodiantes já morreram e
onde é que eles estão, confessando ser a primeira vez que cá vêm. Guardaram as
memórias e vêm à Cabana à procura delas.
E o que faz o Fernando para lhes avivar a memória e satisfazer a
curiosidade?
Temos aí gravações que de quando em vez passamos, sobretudo quando vêm
grandes grupos, e é muito agradável e dá-nos bastante prazer verificar que as
pessoas recordam com alegria e com ternura os Parodiantes de Lisboa.
Pelo que percebo, esta é mais do que uma forma de vida; é também uma forma
de perpetuar uma tradição.
Exactamente. Esta é a casa do pai dos Parodiantes, uma casa que eles
ajudaram a erigir e a dar fama, e cada vez que abrimos a porta às 7 da manhã
estamos a prestar uma homenagem diária aos Parodiantes. Para além disso é uma
casa onde se fazem exposições de pintura, de outras formas de cultura, com
tertúlias todos os meses, e é um sítio que apela e motiva para a conversa, para
o convívio, para a intimidade.
Sente o peso da responsabilidade de ter de dar continuidade a essa tradição?
Sempre trabalhei aqui desde pequenino ao lado do meu pai e fiquei à frente da
casa quando ele faleceu. Senti a importância dessa responsabilidade, mas não
foi difícil para mim uma vez que sempre aqui trabalhei.
Entretanto o tempo passa e há que acompanhar a evolução e as novas
tendências. Como é que define a Cabana nos dias de hoje?
A Cabana dos Parodiantes é um espaço moderno, recentemente restaurado, um
espaço hoteleiro antigo na sua decoração mas simultaneamente moderno. Esta casa
foi projectada nos anos 70 com um toque de visionário, que mistura a
modernidade com a história.
Já alguma vez algum político o abordou e reclamou por lhe ter roubado o
protagonismo de "enfiar Barretes"?
Quando o Sócrates se demitiu, em Maio, eu tive um aumento significativo da
venda dos Barretes e concluí que as pessoas descobriram que havia outros
barretes mais interessantes de enfiar. Com o Passos Coelho houve alguma
recessão na venda mas as pessoas depressa vão redescobrir que se trata de outro
barrete.
Salvaterra de Magos tem reconhecido a Cabana e os Parodiantes como mereciam?
Como costuma dizer-se, em casa de ferreiro, espeto de pau. Ao nível do poder
local não tem havido esse reconhecimento. No que diz respeito às pessoas, há salvaterrenses
que têm bem presente a importância que a casa tem e sabem que é conhecida a
nível nacional. A cultura sempre foi e vai continuar a ser um parente pobre da
política.
Fenómenos como os Parodiantes, num mundo mais tecnológico, com internet,
centenas de canais de televisão e todo o tipo de formas rápidas e
diversificadas de comunicar, têm algumas possibilidades de voltar a surgir?
Um programa como o dos Parodiantes hoje, salvaguardando as diferenças em
relação àquilo que são actualmente as expectativas das pessoas, fazia todo o
sentido de existir, pela irreverência, pelo humor como contra-poder.
Nuno Cláudio
Bem hajam
Carlos Fernandes
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