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sábado, 30 de novembro de 2013

Os Corvos de São Vicente

No tempo da ocupação da Península Ibérica pelos mouros, estes ordenaram que todas as igrejas fossem convertidas em mesquitas muçulmanas. Os cristãos de Valência quiseram pôr a salvo o corpo do mártir S. Vicente, que estava guardado numa igreja. As Astúrias eram a única região cristã da península. Para levar o corpo para as Astúrias, fizeram-se ao mar. Como as águas estavam turbulentas, foram forçados a aproximar-se da costa. Perguntaram então ao mestre da embarcação que terra tão bonita era aquela. O mestre respondeu-lhes que era o Algarve. Pouco depois o barco encalhou e forçou-os a passar a noite naquele lugar. Na manhã seguinte, quando se preparavam para retomar viagem, avistaram um navio pirata. O mestre da embarcação propôs-lhes afastar-se com o navio para evitar a abordagem dos corsários, enquanto os cristãos se escondiam na praia com a sua relíquia. Depois viria buscá-los. O barco nunca mais voltou e os cristãos ficaram naquele lugar. Construíram um templo em memória de S. Vicente e formaram uma pequena aldeia à sua volta. Entretanto D. Afonso Henriques entrou em guerra com os mouros do Algarve. Como vingança, os mouros, arrasaram a aldeia dos cristãos de S. Vicente e levaram-nos cativos. Passados muitos anos, D. Afonso Henriques foi avisado de que existiam cativos cristãos entre os prisioneiros feitos numa batalha contra os Mouros. Chamados à presença do rei, um deles, já muito velho, contou-lhe a sua história e confidenciou-lhe que tinham enterrado o corpo de S. Vicente num local secreto. Pedia ao rei que resgatasse o corpo do mártir para um local seguro. D. Afonso Henriques resolveu viajar com o cristão a caminho de S. Vicente, mas este morreu durante a viagem. Sem saber o local exacto onde estava o santo, D. Afonso Henriques aproximou-se das ruínas do antigo templo. Avistou um bando de corvos que sobrevoavam um certo lugar. Os seus homens escavaram e encontraram o sepulcro de S. Vicente, escondido na rocha. Trouxeram o corpo de S. Vicente de barco para Lisboa e durante toda a viagem foram acompanhados por dois corvos, cuja imagem ainda hoje figura nas armas de Lisboa em testemunho desta história extraordinária.
Bem hajam 
carlos Fernandes

Cerdeira o paraíso na terra onde "O tempo não voa !

Esta pequena aldeia da serra da Lousã viu a população desaparecer no final do século passado. Muito poucos resistiram. Esses poucos iniciaram a reabilitação da aldeia com enorme empenho e esforço pessoal sendo um exemplo de preserverança para as aldeias semelhantes.
De facto a aldeia está constructivamente bastante bem recuperada e valorizada de modo autêntico.
Mas algo torna esta aldeia ainda mais particular. Para além de um considerável investimento particular e de uma enorme qualidade nos pavimentos exteriores creio que a criação de uma pequena oficina artesanal de Kerstin Thomas e a promoção de eventos relacionados com o artesanato, o design, a música e a arte em geral torna esta aldeia absolutamente única.
Na realidade a reabilitação de uma aldeia ou a recuperação de casas e do património não pode apenas passar pelos edifícios, e Cerdeira mostra-o bem com a introdução de cultura e arte erudita no ambiente rural.
Cerdeira renovou o xisto mas renovou sobretudo mentalidades!
A Cerdeira é um local mágico. Logo à entrada, uma pequena ponte convida-nos a conhecer um punhado de casas que espreitam por entre a folhagem. Parece que atravessamos um portal para um mundo fantástico. Tudo parece perfeito neste cenário profundamente romântico. O chão de ardósia guia-nos por um caminho até uma fonte no meio de uma frondosa vegetação.


Mas há mais para descobrir: não passam despercebidos nem um atelier de artesanato (Atelier da Cerdeira), nem uma produção biológica de ervas aromáticas e condimentares (Planta do Xisto), plantada em socalcos, claro. Aliás, em certos momentos do ano, esta aldeia é animada por encontros temáticos que juntam arte e botânica.
Cerdeira onde o tempo não voa !! http://www.cerdeiravillage.com
Bem hajam
Carlos Fernandes


Amigos de Peniche

AMIGOS DE PENICHE

            Quando morreu o Cardeal D. Henrique e foi preciso encontrar um sucessor para o trono de Portugal, defrontaram-se vários netos de D. Manuel I com o rei espanhol Filipe II. Entre os candidatos estava D. António, o Prior do Crato, que chegou a ser aclamado rei pelo povo, reinando durante breves dias; mas, como tinha sido considerado ilegítimo, acabaria por perder a favor do espanhol, não sem antes fazer várias tentativas para se manter no trono. Numa dessas tentativas, tropas inglesas, enviadas pela rainha Isabel I, que o apoiava, desembarcaram em Peniche e marcharam até à capital. Mas, como eram constituídas por mercenários, deixaram atrás de si uma onda de destruição, roubos e saques, até serem obrigadas a regressar a Inglaterra. Ora, como é evidente, "amigos" destes não eram muito bem-vindos e, por isso, quando se quer falar de amizades falsas ou dispensáveis, usa-se a expressão amigos de Peniche – com toda a injustiça que isto representa para os habitantes actuais daquela terra...
Bem hajam 
Carlos Fernandes

Estreito uma aldeia no Pinhal


É provável que o povoamento do actual território da freguesia ascenda a tempos pré-romanos. As condições naturais de defesa que o lugar do Estreito então proporcionava eram manifestamente propícias à instalação de um qualquer povo, talvez lusitano. Eles encontraram aqui um castro natural, inacessível então por todos os lados, excepto pelo lado poente, acesso este que seria vigiado pelo Cabeço da Rainha, e com o qual comunicaria através do cume das serras. Os Romanos devem ter aqui encontrado um problema de difícil solução. Mas com maior ou menor dificuldade lá conseguiram desalojar os aguerridos guerreiros. Sobre a presença romana no chão desta freguesia não existe a mínima dúvida, como atesta a descoberta feita em 1848 junto à povoação de Estreito. Aí apareceu uma considerável porção de moedas de prata romanas, das quais sobressaía uma datada de 88 antes de Cristo, e uma outra, de cobre, com a efígie do Imperador Galeno, que reinou entre 254 e 268 da nossa era. Estreito tornou-se freguesia no longínquo ano de 1535, depois de diversos anos de luta por parte dos seus habitantes. No dealbar do século XVI, então com 30 fogos, era um simples lugar da freguesia de Oleiros. No entanto, havia muito já que os seus habitantes aspiravam e lutavam pela sua independência. No ano de 1515 obtiveram, da Nunciatura Apostólica de Lisboa, um Breve que lhes concedia licença para terem um capelão que lhes dissesse missa e administrasse os sacramentos. Apenas a comunhão pascal não poderia ser dada pelo capelão, o que, no fundo, era um atestado de dependência em relação a Oleiros. E essa clausula seria aproveitada pela Câmara da vila para considerar o Estreito dependente daquela freguesia, tanto que, em 1531, por ocasião da finta lançada para reedificação da igreja matriz, incluiu nela os habitantes do Estreito. Estes não se conformaram, recusando-se mesmo a concorrer para tal obra, alegando que estavam separados da Igreja de Oleiros, já que todos os seus actos religiosos eram praticados na capela dedicada a S. João Baptista, levantada no meio do Estreito. Este templo era “igreja visitada sobre si”, e nela, os moradores “tinham gasto o que Deus sabia, sem ajuda de ninguém”, como se lê no documento pelo qual recorreram. Finalmente, em 16 de Novembro de 1535, a Casa da Suplicação proferia uma sentença, dada em nome de Dom. João III, contra a “Câmara e Concelho de Oleiros”, declarando os moradores do Estreito isentos de contribuir para as obras da igreja da freguesia da sede do concelho. E assim, uma nova freguesia nascia. A paróquia foi uma reitoria da Ordem de Malta, da apresentação do Bailio, ou, segundo a Estatística Paroquial de 1864, do grão-prior do Crato, que era o seu donatário. Seria este o responsável pela apresentação do cura de Estreito que vencia uma côngrua de 3.500 réis em dinheiro, 60 alqueires de trigo, 60 de cevada e 25 almudes de vinho mosto. Para efeitos civis, esta freguesia esteve anexada à de Vilar Barroco de 14 de Março de 1878 a 26 de Março de 1890. Na primeira metade deste século, escrevia-se no “Guia de Portugal” que “no concelho há muitos sítios ermos dignos de ver-se, mas quase todos de difícil acesso. Por estrada, o único realizável, por enquanto, é o passeio ao Estreito. Desenrolando-se sempre em serrania brava, agora a meia encosta de Alvélos, a estrada prossegue para o Norte em direcção à Gardunha, alcançando ao fim de três léguas um severo planalto. A freguesia do Estreito encontra-se aí num refolho da serra do Moradal. Como tantas outras da província, decaiu muito com a ruína dos seus soutos seculares. O lugar é, na Beira Baixa, o único em que não morreu a indústria caseira de criação do bicho da seda, cujo fio as tecedeiras da freguesia utilizam para bordarem, no tear, bonitas cercaduras em toalhas de linho”. Claro que, hoje, e desde há muito, o passeio ao Estreito não é o único realizável. A tecelagem continua a ter grande expressão, constituindo um dos bons valores artesanais da freguesia. A decadência, após a ruína dos seculares soutos, foi um facto, mas a freguesia soube levantar-se a tempo e, nos finais dos anos 60, havia já uma fábrica de resinosos e três grandes serrações. Era o aproveitamento do pinheiro que, então, monopolizava a quase totalidade da população activa, quer na exploração directa, no campo, quer na extracção de derivados, dada a sua importante industrialização. Em termos de produtos agrícolas, desde há muito que o predomínio é exercido pelos cereais, a batata e o azeite.
Bem hajam 
Carlos Fernandes

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Lenda do Pastor e da Estrela

Lenda do Pastor e da Estrela

— Porque razão não poderei atravessar aquelas serras?... Ir ver o mundo que fica do outro lado? Ah! Hei-de ir um dia... hei-de ir! Isto aqui é pequeno para mim… e aquelas serras são tão grandes... tão altas!... Que haverá para além das montanhas?...

Ora aconteceu, segundo conta a lenda, que certa noite o pastor, enamorado do luar e da aragem fresca que corria de mansinho, nem sequer pensou em deitar-se. Ficou-se para ali, sentado, sonhando de olhos abertos... E, a determinada altura — fosse realidade ou sonho — teve a nítida impressão de que uma pequenina estrela descia até ele. Nessa estrela havia um rosto de criança. E a estrela falou-lhe, numa voz meiga e infantil:
— Pastor! É verdade que desejas ir conhecer o mundo? Não tens medo do desconhecido?
Surpreendido, o homem estremeceu.
— Meu Deus! Pois será possível que as estrelas tenham voz?
A vozinha meiga e infantil fez-se ouvir de novo:
— Sim, sou eu que te falo... Mas foi Deus que me enviou para te guiar! Quando quiseres, poderemos partir!
Uma alegria imensa tomou de assalto o jovem pastor.
— Partir?! Disseste que podemos partir?... Ah! Quem me dera, realmente, deixar tudo isto e correr aventuras, descobrir novas terras! Quem me dera!...
O pastor ficou-se extático, ouvindo o seu próprio desejo, mas a vozinha da estrela brilhante que descera do Alto interrompeu-lhe o êxtase, lembrando-lhe com vivacidade:
— Meu bom amigo! Já te disse que tudo depende apenas da tua vontade. Quando estiveres disposto a partir, basta que chames por mim. Eu ficarei à tua espera, lá em cima... junto das minhas irmãs. Adeus, pastor!
E correndo, ligeira, a estrelinha foi juntar-se às outras estrelas.
O pastor seguia-a com o olhar. Mal podia acreditar no que vira e ouvira. A verdade, porém, é que a estrelinha brilhante não mais o abandonou. O pastor todas as noites a via, mais luminosa do que as outras, parecendo até sorrir-lhe. E ele acabou por se resolver à grande aventura.
Uma noite em que o luar não tinha ainda chegado, o pastor olhou o céu e falou assim:
— Oh, minha pequenina estrela! Fosse loucura ou verdade, eu ouvi a tua voz. Pois estou decidido! Que se faça a vontade do Senhor!... Irei à aventura até alcançar aquela grande serra que vejo além, a maior de todas? Oh, minha boa estrela! Desce do céu e vem para me guiares!...
Então o pastor ouviu uma espécie de estranha melodia descendo sobre ele. E de novo o pastor escutou aquela vozita cheia de ternura que já ouvira uma vez:
— Aqui estou! Sabes que cheguei a pensar que não acreditavas em mim? Mas ainda bem que te resolveste!
— Então... a caminho!... Seguir-te-ei para onde tu quiseres!
E, assim dizendo, o pastor dispunha-se já a dar início à sua jornada, quando um obstáculo surgiu. O cão, fiel companheiro do pastor, sentiu decerto uma presença estranha junto dele. Era a estrela! E o cão ladrou na noite escura, pondo em sobressalto toda a aldeia!
Aflito com tamanha irreverência, o pastor apressou-se a impor-lhe silêncio:
— Quieto! Quieto... aqui! Para que ladras tu? A estrela é nossa amiga... Vai levar-nos àquela serra. Vês? Vamos, acalma-te! Ninguém te faz mal!...
Aos poucos, o cão acalmou, e seguiu mansamente o seu dono pelos caminhos do desconhecido.
Na aldeia, os velhos ficaram abanando as sábias cabeças. Era um louco que partia! Fora dali, só poderia encontrar a fome, a miséria e a morte!
De facto, eles quase tinham razão. Durante tempos e tempos o pastor andou como que ao acaso, sem alcançar o seu destino. Foi uma caminhada longa e dura. O alto da serra ficava sempre mais além, e o caminho, que julgara curto, parecia não ter fim. Eram voltas e voltas sem conto. Eram dias e meses passando como fantasmas, sem que o pastor alcançasse o almejado cimo da serra.
O cão, seu fiel companheiro, não conseguiu aguentar a jornada. Ficou no caminho, marcado por tosco sinal de pedra. O pastor, antes de o abandonar, olhou a terra fria, enquanto algumas quentes lágrimas tentavam aquecê-la e disse:
— Deixo-te aqui... Tu foste o meu fiel e único amigo! Onde me levarão os meus passos? Não sei! Conseguirei eu alcançar aquela serra? Só Deus o sabe! Adeus, meu amigo! O teu destino parou. O meu tem de continuar!...
E silenciosamente seguiu rumo ao alto da serra, o pastor que um dia sonhara abraçar de lá todo o horizonte.

Muitos anos passaram. O pastor envelheceu — e a própria estrela também, segundo nos conta a lenda...
Porém, um dia — esse dia havia de chegar! — o pastor pôs o pé no alto da serra! A alegria que sentiu foi quase de loucura. Olhava em redor o vasto e belo horizonte, e a cabeça parecia estalar-lhe. Chorava e ria ao mesmo tempo. Gritava por entre o vento o seu hino de louvor:
— Bendito seja Deus! Bendita sejas tu, minha boa estrela!... Chegámos!...
E o vento, rodeando as palavras do velho, resolveu subir com elas, cheio de cuidado, não fosse perder-se alguma, até lá onde os pés do homem não podem chegar...
Ouvindo-o, a estrela sorriu-lhe e disse:
— Meu bom pastor! Passaste, na verdade, muitos tormentos... Envelhecemos ambos... Mas Deus fez-te a vontade!
Então, dominando o espaço, a voz do pastor soou potente e convicta:
— Aqui ficarei para sempre na tua companhia! Para sempre!
E o pastor instalou-se ali, mergulhando, deliciado, o seu olhar na amplitude vasta do horizonte.

Então aconteceu que o rei daquelas redondezas ouviu falar num pastor que habitava no alto da serra e que possuía uma estrela única no mundo com quem falava todas as noites. Sem hesitar, mandou emissários para que o trouxessem à sua presença.
Quando o velho pastor, um tanto surpreendido, chegou ao palácio do rei, este elucidou-o sobre o seu intento:
— Ouve, pobre velho! Dar-te-ei todas as riquezas que quiseres... farei de ti um homem poderoso para o resto da vida! Em troca, quero apenas que me dês a tua estrela!
O velho pastor olhou o rei com desespero.
— Pedis o impossível, Senhor! A estrela não é minha, é do Céu!
Furioso, o rei gritou-lhe:
— Que importa? Eu sei que ela faz o que tu ordenas... Se tu quiseres, ela será minha!
Com uma dignidade que assombrou o monarca, o velho pastor replicou:
— Senhor, prefiro continuar pobre, desprezado, mas sempre com a minha estrela!
E no mesmo assomo de energia, o velho pastor voltou as costas ao rei poderoso, e abalou de novo a caminho da serra.
Quando lá chegou, a noite ia já alta. Ele atirou-se para cima da enxerga e mordiscou uma côdea de pão negro. Então, a tal estranha melodia já muito sua conhecida desceu do alto e veio sussurrar-lhe aos ouvidos:
— Ainda bem que as riquezas não te tentaram!... Ficaria tão triste! Deixei-te passar misérias para te expor ainda mais à tentação, mas confesso que receei muito! O rei ofereceu-te verdadeiros tesouros...
Erguendo-se da enxerga para onde o cansaço do corpo o tinha atirado, o velho respondeu com lágrimas na voz:
— Ouve, minha boa estrela! Já perdi a conta dos anos. Nem sei desde quando nos conhecemos... Mas quero que fiques sabendo que não poderei viver sem ti, sem a tua luz, sem o teu brilho, sem a tua presença!...
A estrela explicou-lhe, num sussurro, fazendo amainar o vento que corria célere:
— Pois quando morreres, meu bom pastor, podes morrer descansado! Eu aqui te prometo que jamais te abandonarei!
Num êxtase, o pastor encarou a sua estrela. O seu brilho intenso salpicava-lhe de luz os cabelos encanecidos. E o velho, numa voz de profeta, proclamou do alto das montanhas:
— Eu te agradeço o que fizeste por mim! De hoje em diante esta serra há-de chamar-se, e para sempre — a serra da Estrela!

E diz a lenda que no alto da serra desse nome pode ver-se todas as noites, entre as suas irmãs, uma estrela que brilha ainda hoje duma maneira estranha e diferente. O seu brilho derrama reflexos de saudade e de amor sobre a campa desconhecida daquele que foi e continuará a ser — o seu pastor!
Fonte Biblio

MARQUES, Gentil Lendas de Portugal Lisboa, Círculo de Leitores, 1997 [1962] , p.Volume IV, pp. 117-12
Bem hajam 
Carlos Fernandes

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

O Madeiro no Natal


Pode-se falar do madeiro, ou do toro ou cepo do Natal, que é tudo a mesma coisa .
Em muitas aldeias do norte de Portugal, uma boa parte da noite da Consoada se passa à volta de um tronco grosso de pinheiro ou castanheiro, de sobreiro ou azinheira ardendo em brasa.
Há aldeias onde o tronco começa a arder na véspera do dia de Natal e só acaba de arder no Dia de Reis!
É Inverno e o calorzinho bom do fogo aquece as pessoas e dá-lhes uma alegria especial: as conversas e as risadas fazem com que todos se sintam mais irmãos, mais amigos uns dos outros. E essa é a intenção desta festa tradicional.
É realmente uma verdadeira festa. Os rapazes e as raparigas enfeitam os carros de bois, ou (mais recentemente) os tractores com grandes fitas de muitas cores, e lá vão à procura dos troncos mais próprios para a fogueira. No meio da maior algazarra, transportam os troncos até ao adro da Igreja e pegam-lhes fogo. Quando as pessoas saem da Missa do Galo, reúnem-se à volta desta grande lareira ao ar livre, e é um nunca mais acabar de histórias e cantigas, pela noite fora.
Todos os anos se acendem os madeiros e se acende a alegria do tempo do Natal.
Venham às beiras e deliciem-se com este património único.
Bem hajam 
Carlos Fernandes

Castelo Novo Aqui a vida é emoção e o resto é história


Castelo de Castelo Novo localiza-se na aldeia de mesmo nome, Concelho de FundãoDistrito de Castelo Branco, em Portugal.
Erguido sobre um afloramento rochoso na vertente leste da chamada serra da Gardunha, constituía-se no pólo militar em torno do qual se desenvolveu a povoação de Castelo Novo, sucessora da de Castelo Velho, no topo da serra. Castelo Novo, 
 Território ocupado desde o Neolítico, com vastos vestígios romanos,recebeu o nome de Castelo Novo, após o abandono do primeiro conjunto fortificado do povoado .Este topónimo foi utilizado pela primeira vez em 1208 no testamento de Dom .Pedro Guterres , numa doação aos Templários.
.Castelo Novo passou depois para a posse da Ordem de Cristo para garantir o povoamento e defesa do território conquistado aos mouros Dom Manuel I outorgo-lhe o foral em 1510 .
No século XVII , o ouro do Brasil impulsionou o desenvolvimento da vila permitindo a construção do Chafariz da Bica, do Chafariz Dom João V e da igreja matriz.

Na  imagem ao lado  podemos ver o Pelourinho,provavelmente do século XVI de estilo Manuelino , Os termos de sujeição no topo representam cabeças de serpentes. O remate do Pelourinho apresenta uma peça com a Cruz de Cristo , o escudo nacional a esfera armilar e motivos vegetais, é este Universo de saber e história que aguarda a sua visita .
Onde poderá descansar, sonhar e deliciar-se com as  iguarias gastronómicas da Casa Villa Veteris .





Os cesteiros

Os cesteiros trabalham, geralmente, em dependências das suas casas. Estas, tanto podem ser uma parte do andar térreo, sobre o qual se ergue o resto da habitação, como um pequeno espaço independente, construído para ser a oficina. Embora já existam casos em que se percebe a preocupação de conseguir algum conforto no espaço oficinal, a regra, mesmo nas novas construções é a de uma enorme falta de qualidade: não existem janelas, a luz natural entra pela porta de acesso, que comunica com o exterior o que, considerando a duração e características da estação fria, diz muito da penosidade do trabalho de cesteiro. Os interiores das oficinas raramente estão rebocados ou pintados. O cesteiro, que trabalha com materiais rijos e fibrosos, raramente usa luvas, pelo que as suas mãos estão muitas vezes cheias de cortes. A dureza dos materiais exige que, para poderem ser utilizados, sejam mergulhados em água, o que acentua, sobretudo no Inverno, o frio e o desconforto do ofício.

É neste interior, gelado muitos meses no ano, onde a luz escasseia e não existem salamandras ou qualquer sistema de aquecimento, que as mãos do cesteiro transformam a matéria prima numa produção que, mesmo quando é robusta, é sempre elegante. Para além do vime trabalhado inteiro ou "rachado" (com auxílio da "rachadeira" um caule dá origem a três ou quatro bocados, cortados longitudinalmente) o cesteiro utiliza, nas peças de mobiliário ou naquelas que exijam maior robustez, estruturas de madeira, muito simples, feitas por carpinteiro. A oficina raramente apresenta mais do que os diferentes molhos de vime, se- parados pelo respectivo calibre e qualidade (mais fortes, mais finos, com mais nós, mais compridos, mais cónicos, etc.) e o local onde o cesteiro trabalha definido pelo assento, baixo, e, ao lado, pela a mesinha de apoio, onde se dispõe uma escassa ferramenta: o furadouro, o martelo, pregos de vários tamanhos, a tesoura de podar, o "endireita toros", as "rachadeiras".

É ao carpinteiro que o cesteiro encomenda os moldes que precisa para trabalhar. Nem todos os cestos são feitos com o auxílio de molde, "formas", na terminologia de Gonçalo. Segundo alguns cesteiros os modelos mais antigos de Gonçalo serão aqueles "tecidos às mãos", em que o cesteiro trabalha, no mesmo movimento, vários caules, inteiros, de vime. Talvez que a designação da fantástica "mala de forma" denuncie ter sido o primeiro cesto a ser feito com auxílio de molde. A mesma "mala de forma" é, tal como muitos outros produtos de Gonçalo, tecida a "Liaça", uma espécie de fitas de vime, resultado do trabalho da "rachadeira " que abre os caules em três ou quatro bocados, os quais são depois "calibrados", ou seja achatados, por uns cilindros, numa máquina própria (a fieira).

É nesta oficina austera que as mãos do cesteiro "erguem" os cestos que agora tem dificuldades em colocar no mercado. "As pessoas deixaram de os comprar" dizem-nos entre o espanto e a perplexidade.
Ti Celestino Carviçais
Bem hajam 
Carlos fernandes

A comuna da luz “há mais luz nas 24 letras do alfabeto do que em todas as constelações do firmamento”

Luz foi o nome escolhido pelo anarquista António Gonçalves Correia para a Comuna que fundou no Concelho de Odemira em 1917. Inspirara-se nas palavras do poeta Guerra Junqueiro “há mais luz nas 24 letras do alfabeto do que em todas as constelações do firmamento” e sonhava provar, através de uma experiência inovadora, que era possível substituir o Estado burguês por uma organização social mais justa.

Para por em prática as suas teorias, comprou 3 hectares perto do Vale de Santiago e convenceu 15 trabalhadores rurais a viverem ali em grupo, partilhando tarefas e bens. Pretendia também vir a fundar uma escola onde seriam aplicados os métodos racionalistas do espanhol Francisco Ferrer.

A Comuna da Luz sempre olhada pelas autoridades como subversiva, foi destruída pela GNR na sequência de uma revolta popular particularmente violenta que eclodiu na zona em 1918.
 – A Comuna Luz acabou – mas fundei ao pé de Sintra, em Albarraque, a Comuna Clarão. Logo que sai da cadeia, eu e os meus amigos não pensamos noutra coisa. Já lá temos um prédio e terras. Vamos dedicar-nos à horticultura, à floriculturta, à pomologia. O nosso objectivo é tolstoinano. Salvaremos as crianças das ruas: faremos delas homens e mulheres honrados”.

Quem nos fala é António Gonçalves Correia – citado por Raul Brandão (1867-1930) na sua obra Os Operários – dando conta do ânimo que o leva, após o fim forçado da Comuna da Luz (Odemira) e das prisões que se lhe seguiram por motivo das agitações grevistas de 1918 em Vale de Santiago, a um novo projeto de uma comuna anarquista em 1927. Acrescentou ainda o anarquista alentejano a Raul Brandão: “Fizemos um prédio de novo – com 16 compartimentos. O grupo inicial é de 3 criaturas (…) Queremos ligar a comuna a Lisboa pelo telefone. Sonhamos com um teatro infantil. Sonhamos com o belo”.
Quando hoje se fala em sustentabilidade, a comuna da luz é um bom exemplo, para novos empreendimentos na área do turismo !!!!!!!!!!!!!!!
Bem hajam 
Carlos Fernandes 


quarta-feira, 27 de novembro de 2013

O homem do campo

O homem do campo é um homem simples. Ele é a sua tradição é a cópia da simplicidade com que leva a vida, com que foi levado por todo o seu tempo. É simples nas atitudes, nos gostos, na educação.
O homem do campo ama simplesmente. Ama a terra, ama o animal. Ama seu cachorro. Ensina seus filhos com a mesma devoção que prepara sua terra. É fiel a seu cavalo, a sua honestidade e a sua religião. É um homem diferente igual a tantos que simplesmente vivem por ai.
O homem do campo é um forte.Bebe água-ardente e fuma cigarros de barbas de milho . Nasce humildemente numa terra nua. Raramente vê a chuva. - O aldeão simples. Tira o seu sustento da força de seus braços e do suor de sua cara. Convive com a morte desde cedo. Sobrevive por sua força e nota o preconceito. Mas vive, é forte. Sua força esta na sua origem.


Afinal é possível!
Foto: Jorge Bacelar 
Bem hajam 
Carlos Fernandes

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Que tempo é o nosso?

Que tempo é o nosso? Há quem diga que é um tempo a que falta amor. Convenhamos que é, pelo menos, um tempo em que tudo o que era nobre foi degradado, convertido em mercadoria. A obsessão do lucro foi transformando o homem num objecto com preço marcado. Estrangeiro a si próprio, surdo ao apelo do sangue, asfixiando a alma por todos os meios ao seu alcance, o que vem à tona é o mais abominável dos simulacros. Toda a arte moderna nos dá conta dessa catástrofe: o desencontro do homem com o homem. A sua grandeza reside nessa denúncia; a sua dignidade, em não pactuar com a mentira; a sua coragem, em arrancar máscaras e máscaras.
E poderia ser de outro modo? Num tempo em que todo o pensamento dogmático é mais do que suspeito, em que todas as morais se esbarrondam por alheias à «sabedoria» do corpo, em que o privilégio de uns poucos é utilizado implacavelmente para transformar o indivíduo em «cadáver adiado que procria», como poderia a arte deixar de reflectir uma tal situação, se cada palavra, cada ritmo, cada cor, onde espírito e sangue ardem no mesmo fogo, estão arraigados no próprio cerne da vida?
Desamparado até à medula, afogado nas águas difíceis da sua contradição, morrendo à míngua de autenticidade - eis o homem! Eis a triste, mutilada face humana, mais nostálgica de qualquer doutrina teológica que preocupada com uma problemática moral, que não sabe como fundar e instituir, pois nenhuma fará autoridade se não tiver em conta a totalidade do ser; nenhuma, em que espírito e vida sejam concebidos como irreconciliáveis; nenhuma, enquanto reduzir o homem a um fragmento do homem. Nós aprendemos com Pascal que o erro vem da exclusão.

Eugénio de Andrade, in 'Os Afluentes do Silêncio'

Bem hajam 
Carlos Fernandes

Os Serranos

Sei que Vosselências ignoram-no,mas eu posso garantir-lhes : o serrano, que os senhores se propõem imolar nas aras de um pretendido progresso, é um misto de desespero, orgulho, mansidão, meio lobo, meio carneiro, formado desta vegetação rastiça e humilde, da paciência imensurável que representa uma rês a encher a barriga percorrendo léguas .
A serra é por assim dizer a extensão universitária destas aldeias rupestres, desabridas e broncas , autênticas Terras do Demo.
TEXTO: Aquilino Ribeiro
Bem hajam 
Carlos Fernandes

Tintinnabulum a origem do sino

ORIGEM DO SINO

Os judeus e os pagãos conheceram somente o tintinnabulum ou campainha. Esta miniatura do sino é nomeada pela primeira vez no livro do Êxodo. Deus ordenou a Moisés guarnecer de campainhas de ouro a orla inferior do manto de Aarão, o primeiro Sumo Sacerdote, e acrescentou: “Aarão será revestido desse manto quando exercer suas funções, a fim de se ouvir o som das campainhas quando entrar no Santuário diante do Senhor, e quando sair” (Ex. 28, 35). Em número de 72, destinavam-se elas a recordar aos filhos de Israel que a Lei lhes havia sido dada ao som da trombeta.
Entre os gregos e romanos, as campainhas eram usadas em diversos atos civis e religiosos, desde a abertura dos banhos públicos até a consagração de algum templo.
Durante o período das perseguições, deveriam ser silenciosos os meios de chamar os cristãos para as reuniões, de modo a não despertar a atenção dos pagãos. Depois de Constantino, a Igreja do Ocidente passou a servir-se de trombetas para essa finalidade, e a do Oriente usava duas lâminas de cobre, que se batiam uma contra outra.
Não se sabe quem foi o idealizador do sino como hoje o conhecemos. Segundo relato de Santo Isidoro de Sevilha, falecido em 636, sua origem é a região da Campânia, Itália, muito provavelmente a cidade de Nola.

O sino nasceu católico

Nos tempos de Carlos Magno, que reinou de 768 a 814, os sinos eram já muito conhecidos. A propósito da solicitude deste soberano pelas coisas eclesiásticas, o monge de Saint Gall nos conta este singular fato:
“No império de Carlos Magno vivia um hábil fundidor que fez um excelente sino. Apenas soube disso, o imperador ficou penetrado de admiração. Prometeu-lhe o fundidor fazer uma mais belo, se em vez de estanho, ele lhe desse cem libras de prata.
“A soma foi-lhe logo entregue; mas esse mau homem usou estanho, em vez de prata, e em pouco tempo apresentou o novo sino a Carlos Magno. Gostou dele o imperador e ordenou que lhe pusessem o badalo e o içassem ao campanário.
“O guardião da igreja e os outros capelães tentaram tocá-lo, mas não conseguiram. Vendo isso, o fundidor pegou na corda presa no badalo e pôs-se a puxá-la. Mas o badalo se desprendeu, caiu-lhe na cabeça e o matou.”
E o monge cronista conclui: “Aquilo que é mal adquirido, a ninguém aproveita”.
O sino nasceu católico, sua invenção foi reservada à Igreja. E esta o ama como a um filho, a ponto de até baptizá-lo. Bem entendido, não se trata do Baptismo sacramental, que nos torna filhos de Deus, mas de um cerimonial de consagração, como se faz com os vasos sagrados.
Bem hajam


Carlos Fernandes

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Cambas uma aldeia no Pinhal

O repovoamento destas aldeias, durante a reconquista desta parte do território português pelos primeiros reis de Portugal, deve ter sido uma necessidade imediata, sentida desde logo, muito em parte devido à posição estratégica de algumas destas aldeias, situadas junto ao rio, que, durante essa reconquista constituíram uma importante fronteira natural.
Importante ao longo de muitos séculos na vida destas aldeias foi a Igreja, que foi senhora de todas as terras destes sítios, sendo ainda proprietária da barca que fazia a travessia do Zêzere, recebendo por isso parte dos impostos na região.
Cambas foi sede de um pequeno priorado do Padroado Real, sendo o prior nomeado directamente pela casa real. O prior, além de todos os bens que possuía e da parte dos impostos que lhe cabiam, recebia ainda anualmente, uma renda do rei, sendo esta igreja, por isso, uma das mais ricas de toda a região. O priorado de S. João Baptista de Cambas pertenceu ainda durante alguns anos à diocese da Guarda, sendo nessa altura a mais rica de todas as suas igrejas.
O prior da Igreja de S. João Baptista de Cambas, assim se chamou durante muitos anos, tinha rebanhos de cabras e ovelhas, soutos de castanheiros, muitas oliveiras, terras e, inclusive dois ou três cavalos para se deslocar. Foi a Igreja que mandou abrir levadas, que a partir das ribeiras irrigavam as várzeas junto ao rio. Estas levadas ainda hoje se mantêm.
Do antigo priorado de S. João Baptista de Cambas faziam parte, além das terras que constituem ainda hoje a freguesia de Cambas, as freguesias de Vilar Barroco, que foi desanexada de Cambas no século XVIII, e algumas das aldeias que hoje fazem parte da freguesia do Estreito, como são o caso do Roqueiro, Retaxo, Vale do Orvalho e Torre, tal como a freguesia de Orvalho, que no século XV foi igualmente desanexada e se tornou uma vigaria dependente da Igreja e do Cura de Janeiro de Baixo.
Em finais do século XVIII, mais propriamente em Janeiro de 1792, através de uma bula do Papa Pio VI, "Quoniam Ecclesiasticum", bula esta confirmada por Beneplócito Régio de Janeiro de 1794, as aldeias de Roqueiro, Retaxo, vale da Torre e Vale de Orvalho, mais próximas do Estreito do que de Cambas, passam a pertencer religiosamente a paróquia do Estreito, que havia sido criada no século XVI, continuando, no entanto no civil a pertencer a Cambas e ao concelho do Fundão.
A questão dos limites da paróquia e freguesia de Cambas ficou definitivamente resolvida, mantendo essa configuração até hoje, com o decreto de 29 de Novembro de 1836, que pela primeira vez incorporou a freguesia no concelho de Oleiros, determinando-se nesse decreto que os locais que religiosamente pertenciam para o Estreito, também o passassem a ser civilmente.
A freguesia que pertenceu ao Termo da Covilhã, aparece no concelho do Fundão logo que este é criado, tal como Vilar Barroco e Orvalho, também hoje do concelho de Oleiros; pelo Decreto de 29 de Novembro de 1836, a freguesia de Cambas é incorporada, pela primeira vez, no concelho de Oleiros, tal como o são igualmente as freguesias de Orvalho e Vilar Barroco.
Em 1839 a freguesia de Cambas aparece novamente no concelho do Fundão, tal como as freguesias de Orvalho e Vilar Barroco. Na década de quarenta do século dezanove, aparece, novamente, no concelho de Oleiros, tal como as freguesias vizinhas de Orvalho e Vilar Barroco.
Com a extinção do concelho de Oleiros, que se deu a 14 de Janeiro de 1868, a freguesia de Cambas é incorporada no concelho de Pampilhosa da Serra. Orvalho e Vilar Barroco regressam ao concelho do Fundão. Quase dois anos depois, mais propriamente a 28 de Dezembro de 1869, o concelho de Oleiros é restaurado com todos os lugares que antes lhe pertenciam, deixando Cambas, em consequência disso, o concelho de Pampilhosa, assim como Orvalho e Vilar Barroco deixam o concelho do Fundão.
Finalmente a 7 de Setembro de 1895, a freguesia de Cambas é dissolvida, passando Pisoria, Rouco de Cima e Rouco de Baixo, aldeias da margem esquerda do rio, para a freguesia de Amieira, continuando por isso a pertencer ao concelho de Oleiros; as aldeias da margem direita do rio, que constituem a maior parte da freguesia e onde se encontra localizada a sede, passaram a pertencer à freguesia de Janeiro de Baixo e consequentemente, incorporadas no concelho de Pampilhosa da Serra. No ano seguinte, mais propriamente a 21 de Maio de 1896 a freguesia é restaurada com todos os lugares que antes lhe pertenciam, e em consequência disso passou a pertencer, até hoje, ao concelho de Oleiros.
Bem hajam

Carlos Fernandes

Por terras da Ordem dos Hospitalários (mais tarde Malta )

Por carta régia de 13 de Junho de 1194, D. Sancho I, sua esposa, a rainha D. Dulce e respectivos infantes, doaram, em definitivo, a D. Afonso Pelágio, Prior dos Hospitalários, e a todos os irmãos desta Ordem, uma terra à qual deu o nome de Belueer (Belver), além de vastos domínios territoriais nas duas margens do Tejo, entre os quais se compreende Oleiros. Anos volvidos, tais territórios são integrados no Grão-Priorado da Ordem do Hospital ou dos frades malteses, com sede na vila do Crato.
A 6 de Dezembro de 1232, um tal D. Mendo Gonçalves, Prior do Crato concede foral à vila oleirense. Centúrias depois, D. Manuel I renova aquele foral a 20 de Outubro de 1513, constituindo-se assim, definitivamente, como terra autónoma, acção extensível ao vizinho concelho de Álvaro, hoje área integrante do concelho de Oleiros.
Segundo Pimentel in “Memórias da Villa de Oleiros”, no ano de 1762, aquando das invasões espanholas, entre outras pilhagens, foi roubado o maior sino da torre da igreja de Oleiros. Pouco depois o bronze que fora cobiçado pelos espanhóis voltava a repicar na torre da igreja como que a dizer aos Oleirenses que descansassem, pois os espanhóis já se tinham retirado.
No ano de 1791 foi criado um corpo de Ordenanças em Oleiros, tendo sido nomeado Capitão-Mor Francisco Rebelo D’Albuquerque Pinto Maldonado, da mesma vila, por D. João VI, em carta patente de 31 de Maio do mesmo ano. O concelho de Oleiros pertencia à provedoria de Tomar.
No dia 2 de Fevereiro de 1811 ocorreu a passagem de tropas francesas pela vila de Oleiros, na sequência da terceira invasão dos franceses, que teve início em 1810. Um dos grupos de reforços seguiu pela estrada nova, que tinha sido aberta pelo cume das serras, entre as vilas do Fundão e Abrantes, para se reunir ao exército nas linhas de Torres Vedras. Assim que constou que esta divisão iria passar por esta estrada, a população de Oleiros começou a fugir, de modo a deixar as casas inteiramente despidas. A população retirou-se na direcção da margem esquerda do Zêzere, flanqueando a divisão francesa, dirigindo-se para os lugares de Abitureira, Rouco e Cambas.
Com a vinda dos soldados franceses vieram também imensas munições para fornecimento de canhões e espingardas. Os oficiais escolheram para paióis os lugares mais seguros e de mais fácil vigilância. Um dos sítios que lhes pareceu ideal terá sido a Capela de Santa Margarida, dada a sua situação altaneira. A capela ficou repleta de explosivos até que os franceses se decidiram ir embora. Mas, ao retirarem-se deixaram lá dentro alguns barris de pólvora e, de seguida, pegaram fogo à capela. Na deflagração foi “levada pelos ares” a imagem da padroeira da capela, Santa Margarida, que acabou por ser encontrada, no sítio que ainda hoje se denomina “horta da Santa”, estranhamente intacta. Os Oleirenses consideraram o facto como um novo milagre. Este novo milagre sucedeu-se a um outro que tem sido transmitido de geração em geração desde há séculos. Em tempos, toda a região foi assolada por uma terrível praga de gafanhotos que nada poupavam O povo começou então a fazer romarias constantes à ermida de Santa Margarida implorando ajuda para um combate que não conseguia vencer. A santa atendeu-os pois algum tempo depois começou-se a ver grandes filas de gafanhotos encaminhando-se para a ribeira onde morriam afogados. Nem um escapou, ficando Oleiros livre de tão grande flagelo. Em agradecimento, os seus habitantes decidiram celebrar todos os anos uma grandiosa festa em honra de Santa Margarida, o que têm fielmente cumprido.
Após 1834, o território de Oleiros foi consideravelmente aumentado, mas não obstante o Governo extinguiu o concelho, anexando as suas freguesias a outros: as de Orvalho e Vilar Barroco ao Fundão, a de Sarnadas de S. Simão ao de Castelo Branco, a de Cambas ao de Pampilhosa, a de Isna ao de Proença-a-Nova, e todas as outras ao da Sertã. No entanto esta decisão foi anulada em 1869, estabelecendo novamente Oleiros como concelho, tal como fora nos 700 anos anteriores.
A vila de Oleiros teve um pelourinho na praça principal. Em 1824, o então presidente da Câmara, mandou que o pelourinho fosse recuperado a mandou-lhe fazer uma base nova com dois degraus circulares. A encimá-lo colocaram um elegante galo dourado, de folha, tendo por cima a cruz de Malta. Este pelourinho foi vendido no século XIX (1880), tal como aconteceu ao pelourinho da vila de Álvaro, que chegou a ser um concelho independente de Oleiros (foral de 1540).
Bem hajam 
Carlos Fernandes

domingo, 24 de novembro de 2013

Ler a sina arte cigana

A Arte Cigana



A divinação e a profecia têm sido há muito consideradas um domínio especial dos ciganos, um povo nómada  cujo folclore está repleto de lendas sobre poderes secretos e ritos mágicos. E assim como as artes milenares que eles praticam, a origem e o modo de ser ciganos permanecem encobertos pelo mistério, emaranhados em lendas e tradições.
Acredita-se que tenham vivido originalmente na Índia. Mas em algum momento do século IX, eles começaram um lento deslocamento para o oeste. No início do século XV, grandes grupos de pessoas de pele morena, vestidas exóticamente, alegando serem peregrinos religiosos vindos de um país chamado Pequeno Egipto, começaram a aparecer na Europa. Esses "egípcios", ou gypsies, como eles se tornaram conhecidos em língua inglesa, foram de início bem recebidos pelos simpáticos habitantes. Mas algumas tribos errantes logo ganharam má reputação, como pequenos ladrões e trapaceiros sem convicção religiosa.
Os ciganos eram, na verdade, profundamente religiosos. Mas suas crenças e práticas estavam fortemente influenciadas pela magia. Considerados autoridades em assuntos ocultistas, aos ciganos foram creditados com frequência talentos sobrenaturais para além mesmo de suas próprias crenças, e muitos negociaram com avidez seus supostos poderes com habitantes locais. Normalmente, apenas algumas moedas podiam comprar o que fosse: de ervas medicinais para dores a poções do amor e afrodisíacos. Mas foi pela prática das artes da profecia - leitura das cartas do tarô ou da borra do chá, da bola de cristal ou das linhas da mão - que os ciganos se tornaram mais conhecidos.
Os homens ciganos trabalhavam como negociantes de cavalos ou ferreiros; as mulheres prediziam o futuro, frequentemente nas carroças ou pequenas tendas nas quais viviam. A leitura da mão era o método favorito. E assim permanece até hoje: lojas de quiromancia geridas por ciganos florescem nas cidades e vilas de todo o mundo. E apesar de eventuais queixas de práticas inescrupulosas, os clientes continuam a frequentá-las para conhecer a sua sorte. Nada parece poder banir a imagem romântica do cigano pensativo, cujos negros olhos penetrantes fitam atentamente as palmas - e, talvez, os futuros - do esperançoso e do curioso.
Bem hajam 
Carlos Fernandes

A árvore do pão

Desde o Paleolítico que o castanheiro acompanha o Homem e tem para ele uma importância crucial. As tribos pré-romanas chamavam-lhe a árvore do pão, já que o seu fruto, a castanha, era um alimento rico e um importante meio de subsistência para os exércitos em campanha. Pode-se mesmo afirmar que foi um dos mais importantes farináceos em muitas regiões, antes da chegada da batata e do milho à Europa. Era utilizada na alimentação dos Homens e dos animais, era um complemento importante na agricultura e, em muitos casos, o pão dos mais desfavorecidos.
Os entendidos dizem que as variedades portuguesas de castanheiro produzem as melhores castanhas que se conhecem, e são muito consideradas no comércio mundial, nomeadamente em núcleos da emigração portuguesa.

A par de todas as manifestações culturais, salientam-se os castanheiros notáveis que permanecem de pé no distrito da Guarda. São autênticos exemplares, com dimensões inacreditáveis, como o de Guilhafonso e o da Arrifana. O primeiro, com idade estimada em 400 anos, tem uma altura de 19 metros, o que lhe permite ser considerado o maior exemplar da Europa que, em 1987, produziu meia tonelada de castanha da variedade Rebordã, conforme refere Sanches Pereira em "O Castanheiro na Beira Interior". Digno de referência é, igualmente, o "Castanheiro Velho", na Arrifana, que possui um tronco considerado o mais grosso de todos os castanheiros existentes no país, com um perímetro de 13 metros e 20 centímetros. Trata-se de uma imponente árvore que deverá ter uma idade de cerca de dois mil anos, atendendo a que o autor Taborda de Morias lhe atribuiu, em 1937, na obra "Árvores Notáveis de Portugal", 1139 anos. Embora diferentes e com dimensões normais, são também únicos os "Castanheiros Gémeos" de Famalicão da Serra, ainda no concelho da Guarda. Trata-se de duas árvores adultas, separadas na base e no cimo do tronco, mas unidas a meio, em consequência de um «processo de enxertia natural de encosto», refere Cameira Serra no seu livro.

Na Beira Interior são frequentes as terras cujos nomes estão ligados ao castanheiro. No nosso distrito encontram localidades com denominação inerente ao castanheiro. Em poucos exemplos, constatamos isso mesmo: Souto (Sabugal), Monte Soito (Guarda), Castanheira (em Trancoso, em Manteigas, na Guarda e em Gouveia), Souto Maior (Trancoso), Soito do Bispo (Guarda), são um pequeno número de tantos nomes de lugares onde o castanheiro teve um papel importante na toponímia.

Bem hajam 
Carlos Fernandes
FOTO: Raul Coelho

Ferreiro e Ferrador

Paralelamente à profissão de ferreiro existia também a de ferrador. Enquanto aquela exige o trabalho da forja para fazer as ferraduras, esta consiste, apenas, em aplicá-las ou seja, colocá-las nos animais.

Por isso se chama “Arte do Ferro”, ao conjunto de conhecimentos que o ferrador deve possuir para colocar
a ferradura, seguindo os preceitos necessários no casco do animal.

Não se sabe ao certo quando surgiu a ferradura por falta de dados históricos, mas sabe-se que ela apareceu para evitar o desgaste nos cascos dos animais já que estes se tornaram indispensáveis ao trabalho do homem.

Ferrador profissão das mais antigas muitas vezes com oficinas onde se encontrava a forja onde se faziam os diferentes moldes para cascos de mulas, cavalos, e burros. Escolhido o tipo de ferradura de acordo com a variedade do terreno a pisar e com as características do animal, este era colocado para ser ferrado numa armação de madeira apropriada à tarefa e a que se chamava "Tronco".

Para maior segurança prendia-se os beiços do animal com um instrumento a que se dava o nome de "aziar". O ferrador preparava os cascos com os desbastes precisos para ser colocada a ferradura com "cravos" batidos a martelo.

Utensílios do ferrador
Os ferradores não necessitavam de muitos utensílios para fazerem o seu trabalho. Usavam:

TURQUÊS: Ferramenta com dois braços e uma boca de corte para arrancar a ferradura e os cravos e para cortar o casco do animal. Serve também para cortar os bicos dos cravos que são pregados para segurar a ferradura depois de rebitados com a mesma turquês.

FORMÃO: Para aparelhar o corte de casco do animal.

MARTELO: Para pregar os cravos e arrebitar os mesmos.

CRAVO: Espécie de prego de forma alongada e aspecto particular que serve para ajustar as ferraduras ao casco.

FERRADURA: banda metálica mais ou menos larga e comprida, encurvada sobre as sua espessura, em forma de arco de ponte, tendo oito cavidades quadradas piramidais na face inferior chamadas craveiras, onde se alojam as cabeças dos cravos
Bem hajam 
Carlos Fernandes

sábado, 23 de novembro de 2013

O Moita Calado , conversas à volta do Volfrâmio

“O Moita Calado”

Devido à geopolítica da guerra foram os Alemães que mais precisaram do minério da nossa Beira Interior, por outro lado os Ingleses interessaram-se para retirar espaço de manobra ao inimigo. Estudos e investigações recentes revelaram que grande parte desses pagamentos feitos pelos Alemães, foram através do “ouro nazi” .Convém relembrar  que esta designação de “ouro nazi”, engloba o ouro saqueado aos judeus , enviados para os campos de concentração ou emigrados, e retirado dos cofres dos países ocupados . Foi esse “ouro nazi” que serviu para saldar com Portugal as contas de volfrâmio e outros produtos que lhes eram necessários (resinas, madeiras etc).Durante a II Guerra Mundial, Portugal foi atravessado pela chamada “febre do volfrâmio”, mais precisamente as regiões da beira interior. O volfrâmio esteve no centro da economia de guerra. Ao abrigo da neutralidade assumida por Portugal, tanto o Eixo como os Aliados procuraram garantir a concessão de minas que fornecessem as forças militares a que pertenciam.
Sendo o distrito de Castelo Branco um dos focos principais da extracção de volfrâmio. A crescente procura internacional do minério trouxe grande azáfama a esta região, principalmente depois de ganhar fama de ser a mais rica. A anormal densidade populacional, a maneira como cada um procurou a fortuna o “el dourado”, os problemas que se depararam às autoridades centrais e locais, ficaram registados em documentos oficiais e privados, em obras literárias e como não poderia deixar de ser na memória colectiva de algumas povoações , No Fundão em Moncorvo , Montalegre e em muitas outras localidades, o tempo do volfrâmio, deixou, memórias ,mazelas e algumas lendas .
A febre foi mais intensa entre os anos de 1941e 1942, não só favorecida pelo desenrolar da guerra mas também, por uma legislação menos restritiva. Para melhor entenderem este “el dourado”, convém referir, que os preços do quilograma de minério dispararam para os 5oo escudos ou mais, à aquele tempo sem dúvida uma fortuna , Nesse tempo , ao fim de um dia de trabalho de a sol a sol , um assalariado rural dificilmente receberia mais que 40 escudos .
Os concessionários que exploravam as minas mais importantes eram, tal como hoje quase sempre sociedades com capitais e administradores de diferentes nacionalidades, contudo logo que começou a II Guerra Mundial a miragem de bons negócios o lucro fácil, levou ao aparecimento de inúmeras sociedades de média e pequena dimensão. Em muitos casos, a reunião do capital necessário ao investimento junto membros das elites locais (os maiores proprietários, médicos, advogados, farmacêuticos ..) em sociedades de curta duração, e na maioria dos casos nem sem sempre bem sucedidas.,
A par destas sociedades à primeira vista dentro da legalidade surgiram outras, fundadas apenas na palavra de honra. Uma população maioritariamente analfabeta confiava mais em contratos orais do que numa escritura que não conseguia perceber, Era frequente os homens que chegavam às terras do “el dourado”, organizarem-se em sociedades civis , três ou quatro elementos revolviam uma encosta e o lucro da venda do minério que encontrassem era distribuído em função do capital que cada um tinha contribuído .
Eram estes homens que faziam parte da enorme multidão dos trabalhadores ao Kilo ou pilhas como ficaram conhecidos .O que a memória dos habitantes das serras do volfrâmio registou com mais precisão foi estes movimentos de chegadas e partidas destes homens sem destino certo, mas com a inabalável fé de ficarem ricos. Grande parte desta gente seriam assalariados rurais desocupados ou pequenos agricultores que vinham em grupo de um lugar ou freguesia , dormiam onde calhava e comiam do que traziam ou do que encontravam, chegado o inverno regressavam às suas terras de origem quase sempre com as mãos cheias de nada, mas mesmo assim os ricos lavradores queixavam-se a corrida ao “el dourado” fazia rarear a mão de obra e subir os salários, eis que o governo dá-lhes razão e estipula várias medidas para disponibilizar trabalhadores rurais quando as fainas agrícolas o exigissem . Ora esta restrição contribui e de que maneira para o desenvolvimento do contrabando da precariedade para o aparecimento dos ladrões de volfrâmio, que similitude com os de cobre no nosso tempo.
Com uma jurisdição mais complicada, com o desenvolvimento do teatro de guerra a partir de 1942 , para muitos dos que sonharam com o “el dourado”as possibilidades de riqueza tendiam a dissipar-se. Todavia na ânsia de maior fortuna os mais bem sucedidos no negócio como Moita Calado, investiram em minério todo o lucro que obtinham e guardavam-no à espera que os preços subissem . Com o tabelamento veio a falência o volfrâmio teria de ser vendido a preços inferiores ao de compra, O mercado negro não parou , mas os comissários dos beligerantes tinham menos margem para fazerem compras – A miséria alastrou, segundo noticias da imprensa local  dão conta da abertura da sopa dos pobres em várias zonas mineiras o “el dourado” estava moribundo , o nosso amigo Moita Calado completamente falido.
Mas o golpe final concretizou-se em Junho 1944 uma nota oficiosa nos principais jornais. Não deixava duvidas : declarava a proibição da exportação de volfrâmio para todos os destinos .
O “el dourado “ português tinha acabado e com ele os Moitas Calados da nossa terra
Bem hajam
Carlos Fernandes