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segunda-feira, 10 de março de 2014

Hospes Sanatore

Grande Hotel do Caramulo 1928
"O paraíso é sempre onde nós estamos "
Entre no imaginário da exuberância do verde, entre pinheiros bravos carvalhos,cedros, sobreiros,ervídeiros e eucaliptos, salpicados de granito e xisto,sinta o calor da hospitalidade da nossa gente, usufrua de águas puras e cristalinas, respire bons ares, e surpreenda-se nesta viagem
Chegados ao Caramulo, sente-se a brisa atlântica vinda de Aveiro, e a brisa da serra Estrela,impressiona visitar o Caramulo. Logo nos primeiros momentos sente-se que nasceu diferente.
Que é um lugar diferente de Portugal .Que tem alma, tem carácter.
Que obedeceu a uma ideia precisa , a um planeamento inteligente.
A sempre aclamada beleza e exuberância natural é por mais evidente,mas percebe-se também que a mão do homem lhe deu a força, a valorizou a soube aproveitar engenhosamente . Em cada pedra, em cada caminho, até mesmo em cada árvore, está marcada, e sente-se a presença daquele que lhe deu corpo,numa serra agreste e  despida, a um sonho quase utópico.
Revisitar a história, perceber e entender a sua origem,é essa viagem que vos propomos .
Comecemos, então pelo princípio
Corria o ano de 1889.Em Coimbra no dia 14 de Outubro, vem ao mundo Jerónimo Maria de Lacerda, filho de Rosa Maria Pacheco e Abel Maria Lacerda, natural da aldeia da Prova perto da Meda.Abel Maria médico em Tondela, seguindo a tradição familiar, envia Jerónimo Lacerda para a Universidade de Coimbra, de onde sai em 1915 formado em Medicina e Filosofia com a média de 19 valores .Nesse mesmo ano o Professor Elísio Moura convida-o para assistente na faculdade de Medicina. No seguinte conclui o Doutoramento.
Segue-se o serviço militar onde é enviado como médico do corpo expedicionário para a frente da Batalha em Flandres. Está presente na batalha de La Lys em 9 de Abril de 1917. Regressa a Portugal no ano seguinte como Capitão -médico
.
Retoma a sua actividade em Coimbra, como assistente, e reparte os seus serviços como médico por Tondela, onde vive com o seu pai, e pelas Paredes do Guardão, essa meia dúzia de casas que mais tarde irão ser o palco dos seus sonhos . Em Março de 1919 casa-se ficando a viver em Tondela, vindo nos anos seguintes a ter três filhos, Maria Arminda, Abel Maria,e João Maria.
Desde sempre que este lugar era conhecido pelos seus bons ares e águas  cristalinas,acolhendo nos  casebres de madeira  da encosta da serra,hóspedes com fraqueza dos pulmões.O acesso era difícil, na serra não existiam estradas,o solo era pobre e rochoso, não sendo propicio ao cultivo, este decididamente era o interior do Portugal profundo .
Na posse destes dados , com o conhecimento real da região , Jerónimo  Lacerda sonha , fervilha de ideias , tinha chegado  hora da sublime efectivação do saber com o fazer . Assim  em 18 de Janeiro de 1920, no salão nobre do Instituto de Coimbra , reúne a comissão  organizadora da "Sociedade de Propaganda do Caramulo", embrião de um projecto arriscado, que com o tempo irá evoluir e concretizar-se .Passado um ano esta sociedade,dará origem a uma nova a "Sociedade do Caramulo SARL com carácter comercial cuja ideia é, ao tempo,a construção de um grande Hotel em Paredes do Guardão.
É em 8 de Junho de 1922 que o Grande Hotel , abre as suas  portas,na altura apenas a convalescentes sem tuberculose, registando o livro de entradas os nomes de grandes vultos e família da época. A afluência cresce muitíssimo nos meses seguintes em  breve começaram a chegar espanhóis, americanos  e mais tarde , franceses, brasileiros e alemães, o Portugal profundo mostrava-se ao Mundo.
Em 1923 Jerónimo Lacerda fixa-se definitivamente com a família no Caramulo , assim ficaria não só mais perto dos seus doentes como também da sua obra, o sonho cada vez mais se solidifica. Com uma clara visão do futuro, compra todos os terrenos disponíveis com o objectivo de os ceder mais tarde, a quem convencido do sucesso do projecto ali quisesse  investir.
Mas é  a partir de 1925 que a serra irá sofrer grandes alterações, desde logo, o Grande Hotel deixa de fechar entre Outubro e Março o que nos leva a crer,que a partir desta data, ele não se destina só a pessoas fracas,e passa a sanatório .
Projecta-se uma rede de estradas, largas para o uso da época, tanto no Caramulo como de ligação Tondela , Águeda etc.
Constroem-se muros socalcos, fertiliza-se as terras, plantam-se pomares, edifica-se mais unidades de alojamentos e até mesmo uma barragem. Criam-se os serviços florestais para que seja executada a reflorestação da serra , que surge exuberante e verde sobre o Vale de Besteiros. A ideia era que o Caramulo fosse sustentável por si só , além de ao mesmo tempo dar trabalho aos habitantes do concelho .Com este desenvolvimento sustentável o sonho torna-se uma realidade.Foram quatro décadas de glória e desenvolvimento, o êxito dos tratamentos, aliado à hospitalidade e qualidade de serviço, não descurando a parte social em cada dez tratamentos um era oferecido gratuitamente , dando preferência a pessoas do concelho, desde o saneamento básico, ás creches, ao cinema, rádio, a serra tornara-se o caminho mais curto para o paraíso, e nem que o céu fosse o limite.
Ao tempo, as duas únicas juntas de Turismo no país são o Caramulo e o Estoril. A do Caramulo, criada em 1935 já existia desde 1923 mas iniciativa local cujo objectivo era promover e desenvolver a região através de um imposto pago pelos doentes mais abastados .Para se ver a importância desta obra.em 1938 organiza-se um congresso  em que participam mais de trezentos médicos , e muitos mais se seguiram . O rigor clínico o saber do pedagogo a visão higienista, as preocupações sociais do homem , são palavra que saltam inteiras ao falarmos de Jerónimo Lacerda .

 Jerónimo Lacerda, com apenas 55 anos, morre em Lisboa a 17 de Setembro de 1945, vitima de um enfarto.Em 1946 é dado o seu nome , àquele que começou por se chamar o Grande Hotel . Com o aparecimento do BCG dos antibióticos, começa o declínio da Estância Sanatorial do Caramulo.
Emociona, hoje visitar os sanatórios. Hoje daquele sonho quase utópico, restam velhos edifícios  trespassados de silêncios, em espera orgulhosa e vã, marcas de glórias passadas, sinais de fim de estação .
Os antigos sanatórios são hoje apenas repositórios de memórias do tempo em que o Caramulo era porto de abrigo do Mundo .

Se o ar do Caramulo lhe ditou o destino,a sua água nada nas bocas do Mundo . Tal como o ar tem fama de pura e cristalina, revisitar a história , avivar memórias usufruir desta terra encantada  é o que propomos, é isso que nos mata a sede ...
Bem hajam
Carlos Fernandes
 http://www.tsf.pt/Programas/programa.aspx?content_id=918070&audio_id=2988994  

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