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domingo, 1 de dezembro de 2013

Álvaro uma aldeia no Pinhal

O povoamento da freguesia de Álvaro surge com decisão de D. Sancho I de fixar moradores em novos locais estratégicos (em 1194), fortalecendo com concessão de forais as povoações já existentes e, ainda, de estimular o surto económico e agrícola por todo o país.
Embora as terras de Álvaro não estejam explicitamente mencionadas, foram abrangidas na doação de D.Sancho I em 13 de Janeiro de 1194 à ordem de São João Baptista do Hospital.
Segundo Frei Lucas de Santa Catarina, no seu livro de "Memórias" (da Ordem do Hospital de Malta ou Crato), "um certo cavaleiro fez casa no castelo do cimo da colina em que se encontra a localidade, quando da expulsão dos Mouros, que circundavam a região (...) depois destes definitivamente afastados teria deixado os seu haveres a um criado de nome Álvaro Peres, incumbindo-o de povoar e defender o sítio".
Os arqueiros de Álvaro haviam participado em 1247 nas imediações da Sertã, numa batalha conduzida pelo rei D. Afonso III, "O Bolonhês", irmão do próprio rei D. Sancho II, na altura, já desacreditado pelo papa Inocêncio IV, deposto e exilado em Toledo.
Acompanhava na altura o rei um ilustre cavaleiro, D. Fernão de Mendonça, descendente dos senhores de Biscaia, cujo irmão Pêro Dias de Mendonça se fixaria, posteriormente em Álvaro.
Em 1345, no reinado de D. Afonso IV, "O Bravo", já a localidade de Álvaro é motivo de demanda entre a Ordem do Hospital e a coroa. È o próprio comendador da Ordem quem lá aparece "pedindo às justiças da vila que atestassem ser esta da Ordem do Hospital". Este pormenor revela que a localidade de Álvaro já nesta data era importante. A sentença, aposta em pergaminho, constitui o documento escrito mais antigo conhecido relativo a Álvaro e encontra-se arquivado na Torre do Tombo.
Figuras como D. Nuno Álvares Pereira e seu irmão D. Pedro Álvares Pereira poderão ter tido Álvaro como raiz, uma vez que o pai de ambos terá residido nesta localidade.
Em 1375 o rei D. Fernando promulga a Lei das Sesmarias, de modo a reimplantar a cultura cerealífera, compelindo ao trabalho obrigatório com salário tabelado, e funda ainda vários concelhos. Ao delimitar o concelho de Penamacor que acabara de fundar, deu várias povoações que pertenciam à Covilhã. Compensou, então, a Covilhã com as terras de Álvaro, Oleiros e Pampilhosa da Serra.
Após o recurso, passados 6 anos, em 1381, do prior da Ordem do Hospital, que era o mais lesado, o monarca revoga anterior decisão, perdendo de novo a Covilhã estes territórios. Confirmando-se assim a posse de Álvaro à Ordem, que havia promovido o povoamento e organizado a sua defesa.
Com a crise de 1383-1385 complementa-se o conceito de fronteiras, terminando o longo processo de criação da chamada “Consciência Nacional”. Também Álvaro se envolve nas façanhas comandadas por D. Nuno Álvares Pereira, que apelavam à nacionalidade.
Em 1385 durante o reinado de D. João I, reacende-se a luta pela posse de Álvaro e o conflito arrasta-se. Uma carta do rei D. Afonso V datada de 1449, declara a vila de Álvaro pertença do fidalgo Gomes Martins de Lemos, aio do Duque de Bragança e descendente da família originária dos reis de Leão e que era casado com Mécia Vasques de Góis, filha herdeira do senhor morgado de Góis. Este domínio transfere-se posteriormente para descendentes dos Condes de Cantanhede.
Em 1500 (ano em que Pedro Álvares Cabral descobre o Brasil), esta localidade é dotada de um hospital, fundado por Bartolomeu Gomes Curado e suas irmãs, naturais da vila, onde se assistem residentes, viajantes e, sobretudo, peregrinos de Santiago de Compostela. Muito antes de lhe ter sido concedido foral, já Álvaro tinha um tabelião. Assim, no período de 1511 a 1827, pelo menos, a vila de Álvaro manteve um tabelião.
Em 1514, à medida que o monarca organiza internamente o território, dando autonomia às localidades preponderantes, concede assim a Álvaro estatuto político-administrativo próprio, através de foral de 4 de Agosto de 1514.
Pelos vistos, os habitantes de Álvaro não terão sido molestados pelos inquisidores. Segundo o Dr. Júlio Cortez Fernandes: “as populações de Álvaro eram crentes e moralizadas, sem descendência de judeus convertidos à força ou que, por motivo material, houvesse razões para denúncias”.
Desde 1570, ano de criação das Ordenanças, até 1834 em que foram extintas, manteve-se em Álvaro um corpo de milícias composto por quatro companhias num total de 1614 praças.
Após a Restauração e durante o reinado de D. João IV, as gentes de Álvaro participam, tal como as da restante Zona do Pinhal, nos trabalhos de reconstrução das fortalezas fronteiriças do Alentejo e em operações militares de envergadura.
No início do século XVIII, a população do concelho de Álvaro rondava já as 2000 pessoas, das quais mais de 200 eram menores. Em 1708, por exemplo, a vila possuía 90 fogos e o resto do concelho de Álvaro mais 374 fogos.
Por volta de 1810, Álvaro, à semelhança de muitas povoações vizinhas, foi vítima da invasão napoleónica, por grupos de soldados armados que em muitos casos eram grupos de desertores que semeavam o terror por onde passavam. Durante a época das lutas liberais, a vila de Álvaro foi das que mais liberal se mostrou. Com a reforma de 1836 de Passos Manuel, na época de D. Maria II, desintegra-se o concelho de Álvaro, enquadrando-se a vila no concelho de Oleiros até o presente.
A implantação da República em 1910 foi festivamente vitoriada com calorosas manifestações em toda a Zona do Pinhal.
Em 30 de Março de 1968 constitui-se a Liga Regional “Os Unidos da Freguesia de Álvaro”, instituição declarada pelo governo de utilidade pública administrativa, que tem contribuído para inúmeros melhoramentos na autarquia. Mais tarde, já em período democrático, a Zona do Pinhal assiste a uma melhoria da sua rede rodoviária e eléctrica.
Nas palavras de José Marçal: “Álvaro não é apenas, entre o arvoredo, uma mancha de casario com oito séculos. Não é um frasco vazio de essência. Tem a alma do lugar. É um autêntico encanto rústico, onde — como se lhe referiu o escritor José Saramago num dos seus livros, Viagem a Portugal, “as nuvens baixas ajudam a criar uma atmosfera de mundo intocado”. A localidade de Álvaro é, deste modo, sujeito e objecto desta História maravilhosa, que a poeira do tempo não apagou e que se descreve. Não se trata, pois, de ressuscitar fantasmas, feitos cavaleiros andantes nesta era do homem-astronauta. É ler um “poema” embora simples, que é real e muito vivido, escrito pela alma da História de um dos mais belos recantos da Zona do Pinhal, que pela sua localização e pelo pulsar das suas gentes, diríamos que é o Coração de Portugal.”
Bem hajam 
Carlos Fernandes

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